sexta-feira, 3 de julho de 2020

Atualizações de quarentena.

Mês passado foi terrível. A quarentena começou a azedar por aqui. Estava esperando entrar em julho bem, mas isso terá que ser uma transição lenta.

Estou rastreando meus hábitos em uma agenda e consegui bater um recorde! Passei o mês inteiro sem ler ou estudar um dia sequer. Trinta dias. Eu me lembro claramente da única tentativa de leitura em meio a isso, li uma página pequena. Não contou. 

Eu sempre me achei uma pessoa feliz e sortuda, por coincidência comecei a anotar meu humor do dia. Mês passado não tive mais de três dias felizes, nem meu aniversário escapou. Eu me recuso a crer que tenho uma vida triste, mas percebo que ela está mal de alguma forma. Nada que me afete tanto, se não fosse a agenda talvez nem notasse. E isso é o preocupante, será que nunca notei?

No começo da quarentena não conseguia dormir bem, voltei a ter medo do escuro. Fantasmas do passado vinham me perturbar.
Mas agora a luz do banheiro dorme acesa e eu não durmo por outro motivo. É o motivo pelo qual não estou dormindo agora. A mente não para. 

Já fui no passado visitando memórias de infância. Vi o pôr-do-sol ao som de "Era um garoto" e vi a cidade e a noite pela janela enquanto balançava na rede ao som da voz da minha mãe. No futuro imaginei diferentes formas de rever o meu amor, com as devidas correções de realidade. Lembrei de uma música da Mallu que eu ouvia muito quando o conhecia, evitei pra tentar dormir. Depois pensei: que mal uma música faz? E enquanto recitava os versos fui vendo as cenas e sentindo o clima de anos atrás, o coração acelerou. Também lembrei de alguns cds antigos, músicas e mensagens... Livros que tenho que ler. E no presente pensei nas casas vizinhas e em como estarão, nas pessoas. Tudo isso me impedindo de dormir. Hoje acordo cedo. Acordo em menos de duas horas...

Tentei escrever um post sobre a noite outro dia mas acho que acabei perdendo o foco. Sempre foi algo meio importante pra mim. É natural também que a mente relaxe quando estamos deitados e isso faz aparecer muitas e muitas coisas. 

Andei pensando sobre como a minha rotina é confortável. Forte indício de que o conforto não basta pra trazer felicidade. Tenho medo de voltar a rotina normal. Na minha casa antiga a noite eu ouvia as folhas das árvores, os carros e o mar. 

Não sei se já contei mas hoje eu moro numa casa muito importante pra mim, talvez faça um post sobre ela outra hora.  Aqui escuto principalmente o som da geladeira e os movimentos da família durante a noite. Também ouço muito os cachorros da vizinhança, mas agora estão todos quietinhos, e em algumas horas ouvirei os galos cantando. 

"O tempo vai passando cada vez mais veloz... A gente espera do mundo e o mundo espera de nós um pouco mais de paciência"

Nessa música o Lenine fala que a vida é tão rara... Estava eu aqui pensando no quanto ela é frágil. A vida é uma sorte com certeza. Hoje em dia ainda mais, estar vivo é uma sorte. 
O Henry Bugalho publicou um vídeo hoje falando sobre um prefeito que disse "Vamos abrir, morra quem morrer". 
Além de nossas fragilidades ainda tem quem se recuse a dar mais chances pra que todos possam viver. 

É revoltante pensar sobre como o mundo é torto e injusto. Torto no sentido de que cometemos erros e fazemos o mal conscientes disso. A ideia de sofrimento é comum, é aceita. Ninguém liga mais porque já saturou. Apenas tememos/aguardamos pela nossa vez de sofrer. 

"Os gatos nos telhados são aquelas entidades que fugiram do seu lar a muito tempo..."

Um trecho de uma música que eu gosto muito pela delicadeza. Mas me lembrei agora por causa dos gatos nos telhados. Sempre penso que vão quebrar as telhas pelo barulho que fazem. Desconfio fortemente que esses daí não fugiram do seu lar, pelo menos uma deve estar bem em cima do seu lar, ai ai. Porque será que os gatos escolhem os telhados pra passear? 

Então... Eu não quero mesmo voltar a minha rotina normal. Não sei dizer se gosto... Se sou feliz. Mas a cidade grande é o cerne do problema. Quando eu estudava numa cidade pequena tudo era meio mágico, e eu gostava. Me arrependo de ter saído mas penso que fiz o certo.... Então talvez não me arrependa, enfim. Mas a cidade grande te castra. 

Eu tive um sonho bonito outro dia, no começo da quarentena. Sonhei com a faculdade e com a cidade, e me arrependia de não ter visto tudo. É um pensamento frequente meu, sobre não decorar nomes e rostos, não aproveitar amizades e lugares. 

Eu queria poder conhecer a cidade, queria visitar seus lugares. Mas parece que eu estou sendo introduzida nesse "ser consumida pelo cotidiano" (cheio, porque o vazio eu já conheço bem), e eu gosto. 

Mas eu não gosto da cidade, das suas ruas perigosas, das suas pessoas más. Do dia quente e da noite fria. O dia que é perigoso e a noite mais ainda. Não dá pra ficar em paz com o tanto de risco que se corre, com o tanto de história que se escuta.

Assunto pra outro post: eu demorei a aprender que se anda com as pernas.

Mas quem me contou que a cidade castra foi um amigo meu. A psicóloga dele quem disse. Que ele não conseguia se interessar por ninguém porque toda a energia sexual tinha sido castrada pelas sensações de estar numa cidade nova. 

Mas antes do meu amigo eu já sabia:

Não quero voltar a rotina porque não quero voltar a ter medo. A me sentir um alvo toda vez que saio na rua. Além do mais, todas as inseguranças a respeito da vida me pegam. Todos as faltas que tenho comigo, todos os dias em que não quero estar em aula quando é a única coisa que não deveria estar errada. 
(E temos aqui o terceiro assunto que daria outro post.)

Além disso eu estava pensando sobre saudade. E como incomoda na hora da despedida.
"Não foi assim que eu sonhei a nossa vida... (...) Mas a vida não permite ensaios"
Não quero voltar a rotina pra não ter que voltar a sentir saudade, que entra aqui como o quarto assunto que merece um post único. 

E em meio a essa rotina que nem promete nem cumpre, mas se sustenta no básico, nesses dias que voam, que eu acordo e já é de tarde, de noites curtas e... Noites que eu rezo mais pra agradecer do que pra pedir. E que eu peço mais pra poder dar do que receber. Em meio a isso temos o mundo lá fora que está como nunca (mas talvez melhor do que nunca se olhar em uma escala maior...?) E continua rodando com suas pessoas escrotas e suas injustiças. E injustiças e pessoas escrotas. E pessoas escrotas morrendo, e pessoas escrotas morrendo e pessoas injustas morrendo e morrendo.  Não que eu tenha sensibilidade pra me importar com as pessoas morrendo, como eu disse, saturou. Mas me entristece perceber que tudo isso podia ser evitado. Que poderíamos viver melhor.

Mas o quão difícil é se organizar como pessoas, se numa família pequena e isolada tem atritos, cansaços... Imagine em tantos milhões de pessoas. Mas quando será que vamos conseguir melhorar o quadro geral? Será sempre nesse passo arrastado? Quantas geraçōes passarão até vermos uma vida digna com o básico garantido? Em que ninguém mais seja alvo de violência, ou morra de fome, viva precariamente, morra antes do tempo, e possamos entrar em sintonia com a natureza? Eu digo, no sentido prático de não explorar, mas pode ser no espiritual também.

E ainda em meio a isso, eu me estresso. Já faz dois dias que estava estressada no fim do dia. Mas eu quero que seja diferente. 

Hoje eu percebi como é arriscado essa história de interagir, e daí que vem a graça, nunca se sabe o que pode acontecer. Quando você conversa com alguém e troca uma ideia...

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