Conheci um menino que era versado na arte de ser ele mesmo. Me encantava o charme nos seus modos práticos, na delicadeza e peculiaridade das suas demonstrações de afeto, na sua risada impetuosa; e me assustava seu pensar objetivo, suas conclusões, concessões, entregas e descasos.
Mas esse menino não tinha falas. De tanto aprender a agir se esqueceu de como falar. Não me entenda mal, ele sabia se comunicar, sabia manter diálogos. Mas em tantos momentos, decisivos ou irrisórios, lhe faltavam palavras. Ou a coragem para enunciá-las. Então ele dizia "Queria ter uma frase de deus da guerra". Mas essas não vinham e nem bastavam.
O menino precisava aprender a colocar o coração pra fora pela boca, mas seu coração estava confinado na rigidez de sua caixa torácica. Às vezes encontrava brechas e escorria pelos braços até os punhos. Noutras era esquecido, o menino achava que estava ausente. Talvez tivesse feito as malas e ido veranear em uma praia distante.
E que palavras bonitas ou juízos pode emitir um menino sem coração?
A peça que processava suas emoções estava obsoleta, fora trocada pela peça das razões, que não dava trela a um poema e seus rodeios nem a uma menina e suas implicações. Por isso, de tanto querer estar melhor, estar bem, estar aqui, acolá e mais além, o menino foi estando, e deixou de ser.
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