Estou entre um e outros modos de viver. Em cada aspecto da minha vida, se consolida lentamente um estado diferente, causado por resoluções, ações, rotina, influência do meio, memórias, e a forma como é sentir eu. Algo como o que eu chamei em outros textos de clima.
Depois de um período de aproximadamente dois anos, finalmente consigo existir em dias tranquilos a fio, repetitivos, gostosos e surpreendentes, simples e cotidianos, sem que isso seja um problema.
Sirlanney postou um quadrinho certa vez sobre o mito do artista sofredor. Parece muito mais fácil produzir quando se sofre. Em fogo médio. Porque também o sofrimento demais extenua, faz a gente não querer saber do que se passa em canto nenhum, imagina querer condensar isso em texto.
Só que o sofrimento de menos deixa a gente assim como que de bem com a vida. E nisso ninguém quer cutucar mazelas e coisinhas. E fica tão cheia de coisa pra fazer vendo a vida se desdobrar como um túnel de tecido transparente com luz azul e lilás, que a gente vai deixando de lado escrever. Parece que não tem sentimento se rasgando pra sair em texto. E se tiver... deixa eles quietinhos ou, escreve na agenda da terapia, escreve no diário. Nada muito geral e forte que possa virar um texto.
E aí como fica a arte do artista que se apoia na muleta do sentimento? Syr já dizia, e deixo o link no fim do texto, que o bom artista pesquisa e produz. Não precisa usar sangue como tinta pra ter alguma relevância. Me pergunto inclusive se eu comecei a achar que acreditava nesse mito depois de ver a tirinha (totalmente influenciável ela), já que na própria descrição do blog eu escrevo que "o combustível da minha potência criativa [...] é a leitura". Parece que a gente sabe as respostas e desaprende com o diabo do tempo que passa.
E a observância de agora sempre foi meu modo de operar aqui no blog, mas também é ainda resquício da escrita por sentimento. Quero voltar a escrever aqui. Revisitar temas abandonados e discutir sobre eles. E quando se esgotarem os temas, ou antes disso, falar de outras coisas que vejo e que gosto de comentar.
Para o blog e para além dele quero usar meus sonhos como base pra fantasia. Mas sempre achei isso um pouco... Roubo de ideias. Quem planta as ideias dos sonhos na nossa cabeça? E se for apenas aleatoriedade inconsciente, usar sonho como arte não seria o mesmo que usar uma IA?
Tenho desejo de produzir literatura também, apesar das minhas tentativas anteriores datadas e frustradas. Recentemente li um livro desses de distopia adolescente, que é um romance e drama pessoal com pano de fundo político, e fiquei pensando que eu sou perfeitamente capaz de escrever melhor do que a autora, mas isso é outro dos clichês de artista. Quem sabe eu até sou mesmo capaz, mas quem foi lá e fez não fui eu. Mas não abandonei a ideia. Quando falo com alguém em texto, às vezes saem umas combinações tão bonitas que guardo pro dia em que fizer meu romance.
E quero produzir pra além de texto, meus quadros, minhas gravações, meus slides para o sarau com assuntos para diversas faixas de tema. Quero tocar e cantar e musicar uma letra ou outra que escrevi, ou ainda não. E nisso eu perco meu tempo. Sem fazer nada disso.
Corro o risco de ser repetitiva aqui, mas a gente subestima demais o poder das coisas. A gente se contrói. E o que a gente gasta ou perde ou aproveita de tempo no cotidiano é parte importante do que nos forma sem que se perceba. Tudo que se faz ou que não se faz gera algo dentro de nós. Nos muda. Porque o tempo não para. O respiro que dou entre linhas, a música que eu penso. Essas coisas que não se controlam (e que bom?!!) acontecem a gente.
E quando eu acordo, levanto, e vejo uma planta. A planta muda no espaço de alguns segundos. Olhei e senti que era uma planta no estado de acordei, falei alguma coisa e levantei; resultado de quase dois anos acordando e percebendo qualquer coisa errada. E logo em seguida senti que era uma planta no estado de minha semana passada foi boa, e agora tenho isso, isso e aquilo pela frente pra fazer no dia de hoje; resultado do costume recente de olhar, pensar e fazer. É a mesma planta e quem muda sou eu. E o mundo inteiro muda.
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Links para os quadrinhos de que falei, da Sirlanney:
"Eu e as Demônias" Parte 2
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